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Quem tem medo da Abstenção?

Se leram o livro ou viram o filme “Quem tem medo de Virginia Woolf” já perceberam porque escolhi este título para o texto que convosco partilho. As tempestuosas cenas desse memorável filme (com Elizabeth Taylor e Richard Burton) onde as personagens vão "descascando", impiedosamente e até à medula, as múltiplas camadas de mentira e ilusão que envolvem as suas vidas, terminam com uma perturbante frase de Martha (Elisabeth Taylor), quando George (Richard Burton) pergunta “Quem tem medo de viver a vida livre de ilusões?” Ela responde: “Eu tenho, George, eu tenho!”

Pois é assim... A ilusão, a mentira, a aparência são mais confortáveis... É mais fácil ser escravo do que ser livre...




Vem tudo isto a propósito de eu ter perturbado fortemente alguns dos meus amigos quando declarei que não vou votar nas próximas eleições do dia 5 de Junho....

Que não! Que não faça isso!!! Que esse gesto vai ser confundido com irresponsabilidade de comodistas... Que pelo menos vote em branco!!! Ah! Isso não – dizem uns - porque o facto de as mesas de voto serem unicamente constituídas por delegados das candidaturas, sem observadores independentes, facilita a eventualidade de transformação de votos brancos em votos “úteis” (estes são os simpatizantes do “Movimento Voto Nulo”). Nem pensar! – dizem outros – o voto nulo tem a vantagem de explicitar um protesto contra o regime, no entanto contará como voto expresso com efeitos na eleição: deduzindo-se à abstenção obriga o vencedor a aumentar o score para a maioria.!!! Não! Não! Vota nos partidos pequenos, para tirar força aos grandes!!! Ora, ora!!! – respondem do lado – isso de votar nos pequenos é dar poder súbito e não há nada que corrompa mais do que o poder súbito...

Amigos!!! Com todo o carinho que me merecem, tenho que vos dizer que vocês fazem lembrar aquelas famílias que têm o pai em coma irreversível, ligado à máquina, e querem à viva força manter o coitado artificialmente vivo por uma única razão: Medo de ficar ÓRFÃOS!!!!

Cada um de nós tem consciência de que o jogo deste “regime democrático” tem as regras viciadas e está todo armadilhado!!! Chama-se descaradamente “democracia representativa” a um sistema defendido por uma armadura constitucional, legal e regulamentar concebida para impedir a participação da sociedade civil. Os partidos são os exclusivos detentores do Poder. O cidadão, quando vota, não escolhe quem o representa. Apenas legitima as escolhas feitas. Legitimamos deputados distantes do povo, desinteressados das suas necessidades, seguindo obedientemente, em “manada” (desculpem-me a expressão) as instruções da liderança e preocupando-se apenas com a consolidação e o crescimento de seu próprio poder...

Então... por que continuamos a aceitar jogar um jogo de regras viciadas???!!! O que nos impede de (embora sem a violência do 1º de Dezembro de 1640) “defenestrar” pacificamente o regime?

Ah! Talvez porque “eles” (nem sabemos bem quem são, não é?) nos ensinaram na escola, na televisão, nos jornais e em todos os meios de manipulação disponíveis que “ou a democracia ou o caos”!!! Sem ser “isto”... só a “ditadura”!!! Não há alternativas!!!

Francamente!!! Que é feito da nossa criatividade? Que tal começarmos a trabalhar para a formação de um novo sistema?

Quando me perguntam “qual é o meu Partido”, respondo invariavelmente que “Partido, como o próprio nome indica, é uma coisa que não é INTEIRA...”. Como é que uma pessoa que, como eu, ande à procura do TODO, pode alguma vez ser partidária seja do que for???!!!

Lembram-se do que disse Fernando Pessoa quando lhe perguntaram qual era o futuro de Portugal? Ele respondeu assim:

"O nosso futuro é sermos Tudo! Que português verdadeiro pode, por exemplo, viver a estreiteza estéril do catolicismo, quando, fora dele, há que viver todos os protestantismos, todos os credos orientais, todos os paganismos mortos e vivos, fundindo-os portuguêsmente no Paganismo Superior? Não queiramos que fora de nós fique um único deus! Absorvamos os deuses todos! Conquistámos já o Mar. Resta que conquistemos o Céu, ficando a terra para os Outros, os eternamente Outros, os Outros de nascença, os europeus que não são europeus porque não são portugueses. Ser tudo, de todas as maneiras, porque a Verdade não pode estar em faltar alguma cousa! Criemos assim o Paganismo Superior, o Politeísmo Supremo! Na eterna mentira de todos os deuses, só os deuses todos são Verdade.”

A forma como Fernando Pessoa considera a Pátria Portuguesa e o Estado, suscita reflexões mais profundas sobre a nossa postura:

“ 1. Considerar a Pátria Portuguesa como a coisa para nós mais existente, e o Estado Português como não existente. Fazer, portanto, tudo pela Pátria e não pedir nada ao Estado.

2. Considerar que a Pátria Portuguesa existe toda ela dentro de cada indivíduo português. Fazer, portanto, tudo para si mesmo como português, desenvolver-se a si mesmo no sentido português.

3. Considerar que a Pátria Portuguesa, como qualquer pátria, é apenas um meio de criar uma civilização. Fazer tudo, portanto, para criar uma Pátria Portuguesa criadora de civilização.

4. Considerar que o conceito de Pátria é um conceito puramente místico, e que, portanto,

a) nenhum elemento de interesse deve entrar nele
b) nenhum outro conceito místico deve coexistir com ele, a não ser que ele domine esse conceito e o integre em si

Impossível, portanto, (...) ser bom católico, ou bom budista, ou bom qualquer coisa estranha, se se é português, a não ser que se queira criar um catolicismo português ou um budismo português ou o que seja português.”

Em resumo: Talvez Fernando Pessoa esteja a sugerir-nos que sejamos nós próprios. Não sermos aquilo que os outros querem que sejamos... Esta nova Era de Mudança (já todos notámos que ela está a bater-nos à porta?), está a exigir-nos AUTENTICIDADE. É Hora de retornar à essência de nós mesmos! Todos! Coloquemos a nossa criatividade em marcha!!!

Já “sonhei” ou ouvi (não sei...) um nome para o novo regime: SINCRACIA! Acho que ainda não vem no dicionário...O prefixo “Sin...” traduz essa ideia de Unidade que resulta do respeito pelo que há de individual em cada um de nós, transportando a Energia que poderemos aplicar num trabalho criador, de acordo com as nossas verdadeiras capacidades.

Amigos! Não vou votar, porque a Mudança já começou e este sistema ainda não reparou nisso. Talvez – se a abstenção for muito elevada – os políticos despertem para o seu VERDADEIRO papel, não como “políticos”, mas como cidadãos, como Portugueses, como Homens e Mulheres que não podem estar “distantes”, “separados” do Povo, pela simples razão de que SOMOS TODOS UM!!!

Grande Abraço!
Fernanda


2 comments:

  1. Pois é, também se me colocam muitas dúvidas. De uma forma simples ou de outra forma este quadro político à escolha é paupérrimo. Será que não tenho também direito em manifestar o meu desapontamento? Onde o manifesto? Será que deveria haver uma quadrícula onde os defensores da abstenção colocavam conscientemente a sua opção? Se calhar seria uma assembleia representativa com muitas cadeira vazias para vergonha dos defensores deste sistema caduco, se se respeitasse a proporcionalidade manifestada...
    Porque tenho que escolher forçosamente em escolhas impostas?

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  2. Excelente, e quem não percebe isto está completamente a dormir.

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